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terça-feira, 11 de agosto de 2009

Função social da Propriedade por Alessandro Marques de Siqueira

"É de se frisar, como idéia elementar, que é o interesse social quem empresta as roupas da legitimidade a qualquer limitação na esfera privada através da intervenção na propriedade, sobretudo se considerarmos o que objetivamente petrificou o legislador originário: a consagração do Direito de Propriedade.
A possibilidade de intervenção na propriedade afigura-se, pois, possível – e legítima, diga-se – em um contexto onde seu caráter mudou, deixando de ser absolutista e meramente um Direito Individual.
A aludida mudança pode ser constatada ao se observar que nos períodos históricos a anteceder a Idade contemporânea a propriedade serviu apenas aos interesses de uma elite, assumindo caráter absoluto no início desta com a plena vigência do liberalismo: do final do século XVIII até o início do século XX.
À luz do liberalismo originário destacamos que o capital foi tornado, verdadeiramente, sujeito de direito; "um direito inviolável e sagrado", na exata locução da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão.
Mostrando suas falibilidades com o passar dos anos destacamos que o liberalismo começou a ser mitigado. Seu pilar fundamental, a sacramentação da propriedade, começa a ser revista, eis que as proposições burguesas começam a não atender às demandas sociais. Percebe-se que a propriedade, nos termos então vividos, era mais maléfica que benéfica, já que subverteria a ordem natural na qual o "capital" não é sujeito de Direito, mas sim objeto.
Com a comprovação histórica de ser esse conceito sacramentador falho e tendencioso demais, surge o Constitucionalismo Social, que caminhou em paralelo com a atuação social da Igreja, ambos voltados para questões que realmente reclamam a participação de todos os ramos da sociedade.
O movimento do constitucionalismo fez com que nos dias de hoje os Textos Magnos dos países democráticos assegurem o direito de propriedade, garantia subjetiva a ser exercida nos ditames valorativos da função social.
A propriedade muda, assim, seu caráter. Não pode mais ser concebida como fim em si mesma, mas como via de se promover o bem-estar social. Por essa razão fala-se, nos dias de hoje pacificamente, de Intervenção do Estado na propriedade.
Dentre as formas de intervenção estudadas se pôde inferir que o fundamento de cada uma é, em última análise o interesse social. Imediato, no caso da requisição temporal, ou mesmo mediato, caso do tombamento, não resta nenhuma dúvida de que tais espécies de intervenção visam a proteger a coletividade.
Não se tem como negar a importância da possibilidade de Intervenção do Estado na Propriedade. Sem a servidão administrativa inviável seria o saneamento básico em muitas cidades, o que, impreterivelmente, contribuiria para o agravamento da saúde pública. Assim a intervenção acaba sendo uma via realmente efetiva de se garantir os interesses meta-individuais.
Na mesma esteira protetiva é de se destacar o instituto da requisição temporária. Com esse se oferece alento às situações como as decorrentes das constantes tragédias nas auto-estradas. Em um país sem cultura de direção segura no trânsito, não raras vezes tem o Poder Público de lançar mão de bens particulares para fazer frente à demanda não atendida pelo serviço público de saúde. Neste caso é no instituto da requisição temporária que será encontrado uma saída para o problema.
Em sede de conclusão, mais que falar das vias de se implementar a função social – que se operacionalizam nos previsíveis caminhos das regras –, necessário se faz falarmos dela própria. Assim apontamos que essa é norma que podemos chamar de bastante em si, devendo ser aplicada de imediato, ainda que consagradas vozes asseverem ser esta norma programática. Dizemos isto sob o prisma da teleologia, pois a função social não pode ser uma moda para não pegar; ou ainda, roupa fora de moda!
É preciso, assim, que nosso Judiciário esteja preparado para tutelar o embate que por vezes a função social apresenta: o confronto dos direitos individuais e os sociais. Não fazer isso é incorrer em omissão a subjugar os anseios da sociedade. Ater-se os membros desse poder a regras, sem se valer de qualquer ponderação, no caso prático, nada mais é do prestigiar dogmas napoleônicos em uma sociedade pós-moderna, que clama muito mais que a abstenção do Estado."

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Considerações a respeito da liberdade contratual no Código Civil de 2002

Determinar o conceito de liberdade contratual segundo o Código Civil de 2002 requer uma avaliação sistemática do ordenamento jurídico partindo da Constituição Federal para a norma infraconstitucional. Isto porque é notório que toda a leitura da norma jurídica atualmente deve ser feita sob o prisma trazido pela Constituição de 1988, vez que é a carta inaugural do Estado Democrático de Direito e fundamento de validade de todas as demais normas do ordenamento jurídico.
Sendo assim é sabido que a Constituição de 1988 nasceu em um dado momento da história brasileira em que se buscava um Estado jurídico democrático em oposição à Ditadura Militar vigente até então. A liberdade enquanto princípio jurídico recebeu tratamento especial normativo como se fez notar nas garantias às liberdades de locomoção, de expressão, de religião, de iniciativa econômica, à propriedade privada dentre outras tantas.
A liberdade de iniciativa econômica e a propriedade privada são princípios intimamente ligados à idéia da autonomia da vontade ou liberdade contratual dentro do direito civil.
A exigência da realidade social com a multiplicação das operações econômicas e a circulação de riquezas fez surgir o contrato como instituto jurídico, no sentido de regulamentar referidas operações econômicas e é neste sentido que a liberdade econômica e liberdade à propriedade privada podem ser exercidas sob a tutela do próprio ordenamento jurídico que impõe ao Estado limites no que se refere ao intervencionismo nas relações jurídicas no âmbito privado.
Como ensina o ilustre professor José Lourenço dentro do direito civil “ a autonomia da vontade (liberdade jurídica) é a base de formação da teoria geral dos fatos jurídicos”. O fato jurídico em sentido amplo independe da vontade humana, no entanto ocorrido determinado fato no mundo que possa gerar conseqüências jurídicas este é relevante para o direito. O ato jurídico por sua vez é determinado pela ação humana motivada pela vontade, ação esta omissiva ou comissiva. Para melhor aclaramento segue os ensinamentos do ilustre mestre:
Porém, num dado momento, quando o agente decide ou não praticar ou não o ato (comissivo ou omissivo), ele está na esfera da autonomia da vontade sendo, assim, um ato jurídico de categoria mista: autônomo num primeiro momento, heterônomo depois de praticado.”
O contrato enquanto ato jurídico vale-se da vontade como elemento propulsor de sua efetivação. Entretanto o contrato enquanto ato jurídico oriundo da vontade deve respeitar os limites impostos pela lei no que se refere ao livre exercício da liberdade.

[Bruna Neubern em A Liberdade Contratual frente ao novo Código Civil]